sábado, 8 de dezembro de 2018

 O mais importante é o decidir 


“Eu não tenho medo dos anos e não penso em velhice.

E digo pra você, não pense.

Nunca diga estou envelhecendo, estou ficando velha. Eu não digo.

Eu não digo que estou velha, e não digo que estou ouvindo pouco.

É claro que quando preciso de ajuda, eu digo que preciso.

Procuro sempre ler e estar atualizada com os fatos e isso me ajuda a vencer as dificuldades da vida. O melhor roteiro é ler e praticar o que lê.

O bom é produzir sempre e não dormir de dia.

Também não diga pra você que está ficando esquecida, porque assim você fica mais.

Nunca digo que estou doente, digo sempre: estou ótima.

Eu não digo nunca que estou cansada. Nada de palavra negativa.

Quanto mais você diz estar ficando cansada e esquecida, mais esquecida fica.

Você vai se convencendo daquilo e convence os outros. Então silêncio!

Sei que tenho muitos anos. Sei que venho do século passado, e que trago comigo todas as
 idades, mas não sei se sou velha, não. Você acha que eu sou?

Posso dizer que eu sou a terra e nada mais quero ser filha dessa abençoada terra de Goiás.

Convoco os velhos como eu, ou mais velhos que eu, para exercerem seus direitos.

Sei que alguém vai ter que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo.

Tenho consciência de ser autêntica e procuro superar todos os dias minha própria 
personalidade, despedaçando dentro de mim tudo que é velho e morto, pois lutar é a palavra vibrante que levanta os fracos e determina os fortes.

O importante é semear, produzir milhões de sorrisos de solidariedade e amizade.

Procuro semear otimismo e plantar sementes de paz e justiça.

Digo o que penso, com esperança.

Penso no que faço, com fé. Faço o que devo fazer, com amor.

Eu me esforço para ser cada dia melhor, pois bondade também se aprende.

Mesmo quando 
tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.”

Cora Coralina

Decadência

A decadência é o caminho natural de todas as coisas. Tudo tem o seu apogeu e depois o declínio. As plantas brotam, crescem, florescem e mor­rem. Em algumas espécies, a decadência é mais dolorosa do que em outras. É o caso das plantas carnívoras, por exemplo, que no fim da vida só conse­guem se animar diante de um prato de mingau. Até os mecanismos cansam e decaem. É conhecida a história do famoso relógio municipal de Bong, na Baviera, durante muitos anos considerado uma das maravilhas do engenho humano. Situado na praça central da cidade, o relógio tem um imenso mos­trador com ponteiros de ferro trabalhado. Embaixo do mostrador há duas portas. De hora em hora uma das portas se abria e aparecia a réplica perfei­ta de uma camponesa, em tamanho natural, com um balde na mão. Pela outra porta saía a réplica perfeita de uma vaca. Quando a vaca e a campone-­sa se encontravam, a camponesa inclinava-se para ordenhar a vaca. Neste instante, pela mesma porta da qual saíra a vaca, aparecia um camponês que se aproximava da camponesa por trás e lhe dava um belis­cão Com o susto, a camponesa dava um puxão mais violento no ubre da vaca, que dava um chute para trás, acertando um sino, que assim anunciava a hora. Juntava gente na praça e as pessoas vinham de longe só para ver o relógio de Bong. O mecanismo foi se desgastando com o tempo, no entanto, e hoje se tornou imprevisível. Às vezes uma das portas não abre e a camponesa não aparece. A vaca sai e, um pouco depois, sai o camponês. O camponês dá um beliscão na vaca, que chuta para trás e erra o sino. Um funcionário da Prefeitura, de sobreaviso, sai e bate no sino, tendo que se cuidar para não levar um belis­cão do camponês. Às vezes só aparece a camponesa, que se inclina e fica ordenhando o ar. O funcionário então tem que sair, bater no sino, colocar a camponesa de volta na posição vertical e depois empurrá-la para dentro. Já aconteceu de a vaca sair de surpresa, pegar o funcionário por trás e quase fazê-lo voar. Outra vez foi o camponês que saiu depressa demais, desprendeu-se do chão, voou por cima da camponesa e da vaca e entrou pela janela da Prefeitura no outro lado da praça, interrompendo uma sessão do conse­lho municipal. O resultado é que, dois minutos antes de cada hora, toca uma sirene em Bong anunciando que o mecanismo do relógio vai ser acio­nado e que todos devem sair da praça e procurar abrigo, pois a qualquer momento a vaca também pode voar, com conseqüências trágicas.

Um conto de Luís Fernando Veríssimo no livro "O Analista de Bagé"

sábado, 1 de dezembro de 2018

         

                   Carregue apenas o necessário e importante


          Certa vez um viajante deparou com um rio que seria necessário atravessar. Como não havia ponte, ele mesmo cortou troncos de árvores e construiu uma balsa perfeita. Chegando à outra margem, sentiu-se tão apegado à balsa que não teve coragem de abandoná-la. E, assim, carregando-a nos ombros, reiniciou a travessia do bosque. A balsa pesava-lhe sobre os ombros. A balsa que antes tinha sido uma solução, agora se transformara num problema. 
          Muitas vezes a solução de ontem torna-se o problema de hoje. 

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

CATADOR DE LINDEZAS

Eu venho de lá, onde o bem é maior.De onde a maldade seca, não brota.De onde é sol, mesmo em dia de chuva e a chuva chega como benção.Lá sempre tem uma asa, um abrigo para proteger do vento e das tempestades. Eu venho de um lugar que tem cheiro de mato, água de rio logo ali e passarinho em todas as estações. Eu venho de um lugar em que se divide o pão, se divide a dor e se multiplica o amor. Eu venho de um lugar onde quem parte fica para sempre, porque só deixou boas lembranças. Eu venho de um lugar onde criança é anjo, jovem é esperança e os mais velhos são confiança e sabedoria. Eu venho de um lugar onde irmão é laço de amor e amigo é sempre abraço.Onde o lar acolhe para sempre, como o coração de mãe. Eu venho de um lugar que é luz mesmo em noite escura. Que é paz, fé e carinho. Eu venho de lá e não estou sozinho, "SOU CATADOR DE LINDEZAS", sobrevivo de encantamento, me alimento do que é bom, do bem. Procuro bonitezas e bem-querer, sobrevivo do que tem clareza e só busco o que aprendi a gostar. Não esqueço de onde venho e vou sempre querer voltar. Meu lugar se sustenta do bem que encontro pelo caminho, junto a maços de alfazema e alecrim. Assim, sou como passarinho carregando a bagagem de bondade, catando gravetos de cheiro, para esquentar e sustentar o ninho... Talvez a vida tenha feito você acreditar que este lugar não existe. Te digo: existe sim, é fácil encontrar. Silencie, respire, desarme-se, perceba, é pertinho. Este lugar que pulsa amor é dentro da gente, é essência, está em cada um de nós. Basta a gente buscar.
(Rita Maidana).

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

                       A terceira fase da vida


     De repente tudo vai ficando tão simples que assusta. 
     A gente vai perdendo as necessidades, vai reduzindo a bagagem. 
     As opiniões dos outros, são realmente dos outros, e mesmo que sejam sobre nós não tem importância. Vamos abrindo mão das certezas, pois já não temos certeza de nada. 
     E, isso não faz a menor falta. Paramos de julgar, pois já não existe certo ou errado e sim a vida que cada um escolheu experimentar. 
     Por fim entendemos que tudo o que importa é ter paz e sossego, é viver sem medo, é fazer o que alegra o coração naquele momento. E só.


Mário Quintana

terça-feira, 31 de julho de 2018

Maria e Giuseppe – Da Itália para o Brasil
Versão atualizada em julho/2018

      Notando o interesse da atual geração de Manzoli’s pelas histórias de ancestralidade da família e observando, também, que a fila anda, gerações se sucedem e as memórias se perdem e considerando, ainda, que pertencemos à uma geração em extinção, registro aqui algumas memórias que poderão interessar à algum Manzoli ou descendente.

     Por volta do ano de 1680 nasceu em Libiola – fração da (Comune di Sestri Levante, Liguria It) Sante Manzoli.
Sante casou-se com Bárbara Zapparolli Manzoli e tiveram um filho chamado Isidoro Manzoli.

     Isidoro e sua esposa tiveram cinco filhos. O primogênito chamava-se Giacomo Manzoli.

     Giacomo e sua esposa tiveram cinco filhos O segundo chamava-se Domenico Manzoli (1772 a 1841).

     Domenico casou-se com Ângela Martinelli Manzoli e tiveram cinco filhos. O terceiro chamava-se Carlo Manzoli (1805).

Carlo casou-se com Cecilia Benfatti Manzoli e tiveram dez filhos. O primogênito chamava-se Giuliano Martino Manzoli (1830-1900).

     Giuliano casou-se com Giusepha Carnevalli Bertolucci Manzoli e tiveram seis filhos. O quarto chamava-se Giuseppe Vitorio Manzoli (1868-1947)

     Em Poggio Rusco – Mantova It  Giuseppe conheceu Maria, filha de Ângelo Bassoli e Elena Cantoni Bassoli e casaram-se em 27 de abril de 1893 na “Parrocchia Del S. Nome de Maria” em Poggio Rusco – Mantova.

     Em 15/05/1896 tiveram o primeiro filho que lhe deram o nome de Federico Manzoli e em 25/08/1897 o segundo e lhe deram o nome de Osiride Manzoli.

     Para dar uma ligeira visão da situação social da Itália no Século Dezenove, colocamos aqui a resposta de um italiano a um Ministro de Estado de seu País, a propósito das razões que estavam ditando a emigração em massa
“Que coisa entendeis por uma Nação, Senhor Ministro?
É a massa dos infelizes?
Plantamos e ceifamos o trigo, mas nunca provamos pão branco.
Cultivamos a videira, mas não bebemos o vinho.
Criamos animais, mas não comemos carne.
Apesar disso, vós nos aconselhais a não abandonarmos a nossa Pátria?
Mas é uma Pátria a terra em que não se consegue viver do próprio trabalho?”

      Nesse contexto, Giuliano, seu filho Giuseppe e suas esposas decidiram mudar-se para o Brasil e empreenderam essa viagem a partir do Porto de Gênova em 31/10/1898.

     No passaporte de Giuliano Manzoli, emitido na Provincia de Mantova e liberado em out/1898, consta o seguinte:
“O Ministro de Assuntos Estrangeiros solicita às autoridades Civis e Militares de Sua Majestade e das Forças Aliadas deixarem passar livremente
Manzoli Giuliano filho de Carlo que vai para São Paulo, Brasil com sua esposa Carnevalle Giusepha com 57 anos.”
No passaporte de Giuseppe Manzoli, emitido na Provincia de Mantova e liberado em out/1898, consta o seguinte:
“O Ministro de Assuntos Estrangeiros solicita às autoridades Civis e Militares de Sua Majestade e das Forças Aliadas deixarem passar livremente
Manzoli Giuseppe filho de Giuliano que vai para São Paulo, Brasil com sua esposa Basoli Maria com 24 anos e os filhos Federico com 2 anos e Oziride com 1 ano.”
     A viagem foi feita no navio chamado “Minas”. Saiu de Gênova, It em 31/10/1898 e chegou ao Brasil (Santos-SP) em 22/11/1898.
     Maria estava, na viagem, gestante de Isac que viria a nascer em 11/04/1899, portanto, cinco meses da chegada ao Brasil.
     A família chefiada por Giuliano foi encaminhada para a região de Araraquara (SP) e ficou radicada na cidade de Boa Esperança do Sul – SP.
     A nota triste dessa aventura foi a morte de Giuliano Martino Manzoli em 9/2/1900, pouco mais de um ano da chegada ao Brasil.
     Em 10/09/1900 nasceu o quarto filho do casal Giuseppe e Maria que recebeu o nome de Juliano em homenagem ao recém-finado avô.
     Em Boa Esperança do Sul nasceram mais os filhos:
     Ângelo Manzoli em 28/10/1902;
     Eugênio Manzoli em 01/09/1904;
     Ferdinando Manzoli em 08/05/1906;
     Elena Manzoli em 25/08/1907;
     Irma Manzoli em 02/10/1909;
     Remo Manzoli em 01/07/1911;
     Mário Manzoli em 24/04/1913 que faleceu em 1914; e
     Rômulo Manzoli em 26/03/1916.
     Federico, aliás, Frederico, casou-se com Catharina Bonato de Boa Esperança do Sul e foram morar e criar seus filhos Irineu Armando, Valter, Waldir, Milton e Rubens em Araraquara (SP). Viveu até 04/04/1983.
     Osiride, aliás, Oziride, casou-se com a filha de seu patrão, Henriqueta Bertolucci de Bonfim Paulista, em Araraquara onde nasceu a primogênita Anilde Aparecida. Mudaram-se para Pedra Branca SP onde nasceu o segundo filho: Hellio. Mudaram-se para o Parque Industrial de Matão (Toriba) onde nasceu o terceiro filho: Wilson. Em Araraquara nasceu a filha Dirce. Mudaram-se para Jacaúna SP onde nasceu o filho Orlindo. Retornaram para Araraquara onde nasceram os filhos: Yvonne, Ozíride Filho  (eu) e Cleide. Em 1941 mudaram-se para Tabatinga SP de onde retornaram para Araraquara em 1949. Viveu até 08/12/1986
     Isac permaneceu solteiro e trabalhando como pedreiro com seu pai e irmãos. Mudou-se para São Paulo e sempre que podia visitava Araraquara. Faleceu em Araraquara com câncer no fígado em 23/10/1961.
      Juliano casou-se com Santina Ferrari de Boa Esperança do Sul e foram morar e criar seus filhos Carlos José (Carlito); Geraldo; Reinaldo, Nelson e Maria Aparecida em Dobrada SP. Viveu até o início do ano 1960.
     Ângelo casou-se com Felícia Billi de Pirassununga SP, teve quase todos seus filhos nascidos no Estado de São Paulo, nas imediações de Araraquara. Seu Salvo-Conduto foi emitido pela Delegacia de Polícia de Matão (SP). Sua filha Cezira nasceu e foi batizada em Tabatinga SP em 16/06/1934. Mudou-se para o Paraná para onde foi criar seus filhos: Silvio, Diva, Deolinda, Cezira, Marina, Maria, Cecilia, Donato, Antonio e Aparecido. Viveu até 08/03/1995.
     Eugênio casou-se com Amélia Bonato de Boa Esperança do Sul (cunhada de Frederico Manzoli) e foram morar e criar seus filhos Ítalo, Hercília, Hercídio, Oswaldo, Eunice, Ítalo e Eduardo Armando em Olímpia SP, com casa comercial de tecidos e armarinhos no centro da cidade com o nome de “Casa Manzoli”. Viveu até 14/04/1999 
     Ferdinando casou-se com Felícia Diana, de Sertãozinho SP e foram morar e criar seus filhos Clarice, Lourdes, José, Luiz, Claudina e Cláudio em São Paulo SP. Viveu até 06/07/1958.
     Elena casou-se com Maurício Carpigiani e foram morar e criar suas filhas Alzira, Elza e Esther em São Paulo SP.Viveu até 07/12/2001.
     Irma casou-se com Antonio Diana de Sertãozinho SP e foram morar e criar seus filhos Abner, Orlando, Ilda, Antonio, Zineide e Zinedir em São Paulo SP.
     Remo casou-se com Alzira de Angelis, de Santa Maria da Serra SP e foram morar e criar seus filhos José, Renato, Maria, Eugênio, Rene, Reinice e Lenira em São Paulo SP.Viveu até 23/12/1999.
     Rômulo casou-se com Joventina Sigo e foram morar e criar seus filhos Sérgio, Vilma, Roberto e Wagner em São Paulo SP. Existe registro de inscrição de firmas comerciais da Comarca de Pederneiras SP em nome de Rômulo Manzoli  com data de 20/08/1940.
     O casal Maria e Giuseppe mudaram-se para São Paulo SP, Vila Carrão, onde viveram ainda muitos anos de suas vidas. Giuseppe faleceu em 30/04/1947 com 79 anos de idade e Maria em 05/05/1968 com 94 anos de idade. Lembro-me da visita da “Noninha” – como a chamávamos – a Araraquara onde presenteou-nos com sua presença por mais de semana. Foi muito agradável, passava os dias fazendo meias de lã com pontos de tricô com três ou quatro agulhas, não me lembro.



Osíride, Eugênio, Ângelo, Juliano, Isac, Frederico, Ferdinando, Elena, Rômulo, Maria Bassoli Manzoli, Giusepha Carnevalli Bertolucci Manzoli, Giuseppe Manzoli, Remo e Irma.

sexta-feira, 11 de maio de 2018


Somos bons?
  Essa é uma questão essencialmente filosófica que surge em terapia depois que o paciente começa a questionar o modelo do fazer, sua educação anterior e a natureza do bem e do mal. A maioria das pessoas passa a vida pensando que não presta, que precisa ser punida, controlada ou reprimida porque sua verdadeira natureza é baixa e maligna.
Uma escola de pensamento define o homem como essen­cialmente mau. Com base nessa filosofia, nasceu a necessidade de poder e controle para que instituições como a Igreja e o Estado do­minassem as massas. Essas instituições usam a punição e a disciplina férrea para manter a ordem, amedrontar e subjugar, impedindo que se espalhem as sementes de nossa "maldade" inerente. Essa linha de pensamento acredita que o homem não consegue tomar decisões e que é preciso uma liderança forte (ditadura) para manter as massas no rumo "certo" (O Senhor das Moscas, de William Golding, é um romance assustador baseado nessa crença filosófica).
A escola filosófica oposta prefere acreditar na bondade ine­rente do homem e na premissa de que, quando tem escolha, ele tende a fazer o bem mesmo que isso seja mais difícil e compli­cado.
O paradoxo dessa escolha é o fato de que, embora a opção pela bondade não seja a mais simples, seu resultado é uma vida "mais fácil". Muitas vezes, optar pelo bem não parece certo, ao passo que a escolha mais fácil pode parecer inicialmente melhor, mas resultar em uma forma de maldade. Um exemplo perfeito desse paradoxo é o conceito de zelo. Nosso modelo do fazer define todo comportamento zeloso como bom, o que nem sempre é verdade. Quem precisa de cuidados não consegue manter-se no controle da própria vida. A escolha da bondade, portanto, e o controle sobre essa escolha pertencem a quem dá, e não a quem recebe cuidado, o que é o oposto da intenção. Pode haver uma forma de maldade quando a pessoa que cuida recebe todo o crédito pelo ato e não permite que o alvo de seus cuidados tenha nenhum poder nem controle sobre as conseqüências. Nesse caso, a opção por não cuidar pode ser "melhor", mas não será a mais fácil. Escolha envolve aprendizado e prática. A prática da bondade é um processo de tentativa e erro.
Você é bom! Você pode escolher entre praticar ou não a bondade. Pode assumir a responsabilidade por sua vida e seus atos. Pode tomar conta de si mesmo. Você pode acreditar em sua bondade e na bondade alheia. Dessa forma, pode tornar-se um exemplo de bondade.

(Suzana McMahon – O Terapeuta de Bolso)

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Mãe, posso dormir na casa da vó hoje?

Escutei dentro do ônibus hoje de manhã.
Quando consegui me virar para ver a criança  que me fez voltar ao passado apenas com uma frase, ela já não estava mais ao alcance dos meus olhos. Viajei longe.
Quando foi que o tempo passou e nos fez adultos cheio de prioridades chatas?
Lutamos todos os dias por alguma coisa que não sabemos se é o que realmente queremos, quando na verdade, casa de vó é o que todo mundo precisaria pra ser feliz.

Casa de vó é onde os ponteiros do relógio tiram férias junto com a gente e passam os minutos sem pressa de chegada.
Casa de vó é onde uma simples macarronada e um pão caseiro ganham sabores diferentes, deliciosos.
Casa de vó é onde uma inocente tarde pode durar uma eternidade de brincadeiras e fantasias.
Casa de vó é onde os armários escondem roupas antigas e ferramentas misteriosas. 
Casa de vó é onde as caixas fechadas se tornam baús de tesouros secretos, prontos para serem desvendados.
Casa de vó é onde os brinquedos raramente surgem prontos, são todos inventados na hora.
Casa de vó tudo é misteriosamente possível de acontecer. Mágico. Sem preocupações.
Casa de vó é onde a gente encontra os restos da infância dos nossos pais e o início de nossas vidas.

Casa de vó, só mesmo lá dentro, no endereço do nosso afeto mais profundo, tudo é permitido.
Esse luxo não pode me pertencer mais - infelizmente - viverá comigo apenas nas mais bonitas recordações.
Mesmo assim se eu pudesse fazer um pedido agora, qualquer pedido, de todos os pedidos do mundo eu iria pedir a mesma coisa.

Posso dormir na casa da vó hoje?

(Autor desconhecido)

quinta-feira, 5 de abril de 2018


      Antepassado

Só te conheço de retrato,
não te conheço de verdade,
mas teu sangue bole em meu sangue
e sem saber te vivo em mim
e sem saber vou copiando
tuas imprevistas maneiras,
mais do que isso: teu fremente
modo de ser, enclausurado
entre ferros de conveniência
ou aranhóis de burguesia,
vou descobrindo o que me deste
sem saber que o davas, na líquida
transmissão de taras e dons,
vou te compreendendo, somente
de esmerilar em teu retrato
o que a pacatez de um retrato
ou o seu vago negativo,
nele implícito e reticente,
filtra de um homem; sua face
oculta de si mesmo; impulso
primitivo; paixão insone
e mais trevosas intenções
que jamais assumiram ato
nem mesmo sombra de palavra,
mas ficaram dentro de ti
cozinhadas em lenha surda.
Acabei descobrindo tudo
que teus papéis não confessaram
nem a memória de família
transmitiu como fato histórico
e agora te conheço mais
do que a mim próprio me conheço,
pois sou teu vaso e transcendência,
teu duende mal encarnado.
Refaço os gestos que o retrato
não pode ter, aqueles gestos
que ficaram em ti à espera
de tardia repetição,
e tão meus eles se tornaram,
tão aderentes ao meu ser
que suponho tu os copiaste
de mim antes que eu os fizesse,
e furtando-me a iniciativa,
meu ladrão, roubaste-me o espírito.

Poema de Carlos Drummond de Andrade

domingo, 18 de março de 2018


O que fazer pelos outros


         Amelhor coisa que um indivíduo pode fazer por outro é tornar-se um exemplo de auto-estima e de interesse social. Não ha muitos bons exemplos disso no mundo. Se você praticar a auto-estima, será um exemplo vivo, equilibrado e positivo. Quando você aceita, incentiva e responsabiliza a si mesmo e não se culpa, mostra ao outro que isso é possível. Essa é a forma mais poderosa de ensinar, ainda que você não a perceba. A prática da auto-estima compõe-se de comportamentos não-verbais que só são apren­didos através do exemplo. Quanto maior for nossa auto-estima, mais nos tornaremos um exemplo poderoso para o outro. O velho ditado que diz que devemos praticar o que pregamos é relevante, mas, nesse exemplo, praticar basta.

     Quando você se aceita e desiste de ser perfeito, aceita tam­bém o outro com todas as suas imperfeições. Essa aceitação é poderosa e induz o outro a aceitar a si mesmo. Quando você se perdoa e aprende com seus erros, o outro percebe que pode fazer o mesmo. Ele talvez nem pretenda aprender com você, mas a velha justificativa de que todos querem ser perfeitos não terá mais crédito. Quando você se liberta da culpa e da autopunição, compreende sua inutilidade.
    
     Toda vez que disser "não" a alguém, dará a ele o direito de dizer "não" a você. Se disser isso sem cul­pa, permitirá que ele também o faça. Ao suprir suas necessidades, demonstra que o outro pode fazer o mesmo. Quando denota co­ragem, o outro será capaz de imitá-lo. Afetamos a vida das pessoas próximas de muitas maneiras. Reagimos ao incentivo e ao apoio, ao negativismo e ao desestímulo. Para combater o negativismo, precisamos ser muito mais positivos. Você pode exercer essa força positiva no mundo.
    
     Amar incondicionalmente é uma das coisas mais poderosas que podemos fazer pelos outros. Quando temos auto-estima e amamos incondicionalmente a nós mesmos, nosso exemplo basta. Não é preciso fazer nada, pois o demonstramos. Quando nos permitimos ser, passamos ao outro a mesma condição. Se deixarmos de nos justificar e de acusar o outro, acabaremos com o jogo da culpa. Isso proporcionará o ambiente seguro de que todos nós estamos tão necessitados.

     O interesse social não força a mudança alheia. Pelo con­trário, permite e incentiva essa mudança. O interesse social e a auto-estima promovem o crescimento e o desenvolvimento. Precisamos ensinar e aprender com o outro. Precisamos dele para interagir, partilhar a mútua descoberta, comemorar as conquistas.
Precisamos do outro porque somos ligados, unidos, fazemos parte do mesmo todo. Juntos podemos crescer e atingir a reunificação. Mas não podemos fazer isso sozinhos. Precisamos do outro para o desafio de ultrapassar o abismo existente entre os seres humanos e compartilhar nossas semelhanças. Precisamos do outro como ele precisa de nós: não para cuidar, e sim para amar, não para fazer coisas por nós, e sim para fazer juntos as coisas. Em resumo, ser o melhor possível para o outro é exatamente ser o melhor possível para nós mesmos.

Suzanna McMahon